ACONTECEU EM NOVA YORK
(Publicado no caderno "Idéias", do "Jornal do Brasil", em 28 de dezembro de 1996)
Escritor premiado arma trama com personagens saídos do submundo da metrópole
Uma longa fila de homens mortos - Lawrence Block - Tradução de Beth Vieira - Companhia das letras - 334 páginas - R$ 21,50
O mordomo não apareceu desta vez, mas Uma longa fila de homens mortos, de Lawrence Block, segue a trilha do romance policial clássico. O ponto de partida é um estranho clube, cujos integrantes se reúnem uma vez por ano apenas para saber qual membro “esticou as canelas”. Quando as mortes começam a não parecer naturais, eis que surge o meticuloso detetive Matthew Scudder, um assíduo freqüentador das reuniões dos Alcoólicos Anônimos e dono de uma filosofia existencialista que faria sucesso em qualquer fila para pagamento de aposentados. “Qual é o saldo que ninguém algum dia já teve dos anos que se foram?”
O autor, que recebeu o pomposo título de “Grande Mestre dos Escritores da América”, tem no currículo prêmios importantes, como o Edgar Allan Poe e o Malthese Falcon. O texto até que faz jus às medalhas. O imprevisível, requisito básico numa trama policial, dá o tom através de suspeitas de suicídios e acidentes que podem, de uma página para outra, se transformar em homicídios mais do que qualificados.
Como a história quase não sai de Nova York, pode-se tomar contato com os recantos e personagens mais estranhos da Grande Maçã. Não que Block caia na cilada de tantos roteiristas pós-Tarantino, que adoram preencher suas tramas insossas com personagens tão bizarros quanto inúteis. O autor, um detalhista de mão cheia, aqui concentra a atenção de sua história quase toda na morbidez do Clube dos Trinta e nas atitudes inesperadas de Scudder.
Lá pelo meio do livro, no entanto, o autor quebra o compasso e dá uma geral na rotina de Scudder, que se revela um tédio só, contagiando o leitor e o obrigando até a acompanhar os comentários de uma partida de beisebol. Antes que o problemático detetive gire o canal para o golfe e o futebol americano, o interessante caso do Clube dos Trinta, que na verdade são 31, o desperta para a história.
O funcionamento do clube segue uma lógica bem criativa. Depois que os 30 membros morrem, o trigésimo-primeiro lê o nome dos que morreram e recomeça a coisa toda. Uma espécie de Clube do Bolinha com boas pitadas de morbidez e que se revela ótimo argumento para um livro policial.
Mais mórbido que o Clube dos Trinta, no entanto, é o próprio final do livro, com uma ressalva apenas para o descenecessário e complicado enigma que chega às mãos de Scudder. Lawrence Block encontrou a medida certa entre o imprevisível e a fantasia, numa história em que nenhum figurante fica de mãos abanando. O mordomo ficou mesmo para a próxima.
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